quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Greve e gravidade do momento

Universidades e institutos federais estão em greve desde 17/05. O governo Dilma não acreditou que a greve ocorresse; depois, que durasse. Por isso, só apresentou uma proposta dois meses após. Como era indecorosa, cheia de armadilhas, a rejeição foi retumbante. “Outra” proposta foi apresentada, mas a essência da anterior foi mantida.

Mas, por que não aceitamos nada? Porque, além de recomposição salarial verdadeira (e não as mentiras dos tais 45%), precisamos de garantias para a valorização de nosso trabalho.

Nas propostas do governo é possível constatar: 1) desconsideração de nossa pauta, pois não propõe um Plano de Reestruturação da Carreira; 2) ataque à autonomia universitária, colocando o MEC como sujeito a definir critérios não explicitados para várias atividades; 3) impedimento à progressão na carreira, quanto ao reenquadramento dos professores hoje próximos da aposentadoria; 4) protelação de aspectos importantes do plano, como tempo na carreira, critérios para avaliação do trabalho docente e outros pontos conceituais. Tudo é deixado para posterior discussão em grupos de trabalhos.

Ora, esses grupos já nos são velhos conhecidos. Qualquer docente – até mesmo aqueles ligados ao Proifes, que é um tipo de “sindicato” de professores ‘genuinamente’ puxa-sacos do PT e congêneres – sabe que isso não funciona. Se funcionasse, não estaríamos em greve; afinal, sem contar os anos anteriores, em 2011, foi formado um grupo. Por isso, naquele momento, a greve não ocorreu.

Demos crédito ao governo. No entanto, pouco antes das reuniões, o governo petista alegava “diarreias”, desmarcando os encontros. Por esse desrespeito não podemos passar mais. Chega! Paciência tem limite. Tudo tem de ser firmado na greve. Ou avançamos na proposta – em greve – ou nos calamos de vez.

Agora, se retrocedermos, sem absolutamente nada de concreto, assistiremos à morte por estrangulamento de nossa categoria; logo, a morte da própria Universidade, que já se encontra na UTI. Este é o momento de garra, de “guerra”.

Nesse sentido, peço aos leitores que compreendem a importância de termos universidades públicas com qualidade, que façam intervenções possíveis junto a políticos de todos os partidos.

Depois de duas décadas de pauladas ininterruptas no cérebro da Universidade, chegamos ao limite. Não podemos mais permitir a sequência dessa destruição. Afinal, o país já está pagando caro pela falta de qualidade no ensino.

As provas da tragédia de nossa educação são visíveis; são constatáveis em cada nova pesquisa. 74% da população não é plenamente alfabetizado; até soletra, mas não compreende o que lê. Pior: saídos desse contingente, 38% dos universitários – que são apenas 20% da população – estão na mesma situação de semialfabetizados. Estamos perigosamente regredindo, senhores!

O real tamanho dessa regressão pode ser mensurado quando olhamos para outros países. O último Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), aplicado em 65 países, expõe o Brasil em 57º lugar em Matemática e na 53ª posição em Linguagem e Ciências. Isso é gravíssimo. Os reflexos dessa ignorância são tão previsíveis quanto assustadores.

Finalizo este artigo, pedindo novamente não só a compreensão, mas a participação de todos em nossa greve. Nós, docentes, por respeito à sociedade, precisamos de condições plenas para a autonomia acadêmico-didático-científica, de condições de trabalho.

Queremos, sim, a expansão da universidade, mas com a garantia da qualidade. Sem isso, tudo é muito perigoso para o futuro.



*ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ - dr. em Jornalismo/USP; prof. De Literatura/UFMT 

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